Música nos tempos de pandemia

(agradecimentos ao Núcleo Hespérides - Música das Américas)

A música é tudo o que você quer que seja música. Uma performance é tudo o que você quer que seja uma performance. Tocar uma campainha pode ser música, se você quiser que seja! Depois a gente pode começar a escolher, a preferir, a elaborar. Adicionamos um piano à campainha, por exemplo. Ritmo, harmonia, contraponto se for o caso. Ou pandeiro e reco-reco.

Nasci em 1958. “Fui violoncelista . . .” Passei por uma época (de vários, de muitos anos) em que minha definição da música e da performance eram estreitas: música é música clássica e canônica; performance é recital de música clássica, com terno e sapato. Sentadinho bonitinho.

A um certo momento comecei a redefinir a música e a performance, assim como “a minha música” e “a minha performance”. Tirei uma década sabática, sem performances, e frequentemente sem prática cotidiana de violoncelo. Eu “precisava da distância” para achar o meu caminho. Aos poucos fui me transformando. O violoncelo virou arauto, alaúde, trompete, Proteu. E a sala de concerto virou o mundo. Por exemplo, um dia dei um recital solo no Starbucks da minha vizinhança.

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Fui abrindo e adicionando: canto, piano, improvisação, composição, teatralidade. Flauta ameríndia. O mais recente é o violão. Vale tudo, tudo vale; amor, prazer; nada de obrigatoriedade e dever. A meu ver, o exemplo máximo desse princípio é Hermeto Pascoal—que, além de ser uma força criativa profunda, é um grande profissional, uma enciclopédia.

Meu “âmago” é introvertido. Preciso de tempo e espaço para sonhar, inventar, sentir e elaborar, antes de partilhar. A pandemia e suas quarentenas (2020-21) deram ao introvertido condições ideais de trabalho. Tive o melhor ano da minha vida, o mais criativo, o mais prolífico, o mais intenso. Nem vou fazer a lista de tudo que eu consegui nesse ano, pois você vai achar que estou mentindo, não é possível um cara só fazer tantas coisas! Mas fiz.

Instantâneos desse tempo de pandemia:

Os concertos íntimos no pátio central do meu prédio estão aqui.

A exploração da flauta ameríndia está aqui.

Nessa exploração, há entre outras coisas uma homenagem ao Hermeto.

A minha página no SoundCloud tem de tudo, inclusive o maravilhoso violoncelo canônico (Debussy, Hindemith, Barber, Mignone, etc.).